quinta-feira, junho 15, 2006

Soldadinho de Chumbo


O meu irmão tinha um trabalho de casa que consistia num desenho acerca da história do Soldadinho de Chumbo. Veio mostrar-me a sua obra de arte, a qual tratei de elogiar devidamente.
Após alguns minutos vem trazer-me outro soldado, desenhado especialmente para mim. Engraçado como estes pequenos actos conseguem assumir um valor gigantesco, quando nos apanham desprevenidos.
Recuando alguns anos atrás, sempre me lembro de ter desejado um irmão, só não o esperava 13 anos depois do meu próprio nascimento.
Fui filha única durante muito tempo, com o direito a todos os privilégios que daí advêm, o que me fez perceber, sem preocupação, que existiria mais uma pessoa para se tornar no centro do mundo dos meus pais.
Lembro-me perfeitamente de acompanhar toda a gravidez da minha mãe, de todos os exames a que fomos juntas, de todas as lojas a que não resistíamos entrar, de todas as conversas que tivemos sobre o ser que vinha a caminho, dos momentos em que tudo parava para sentirmos o movimento dele na sua barriga.
Por vezes, lembro-me de ir mexer na gaveta que guardava os babygrows e ficar horas, sentada no chão, a imaginar como seria a criança que ali caberia. Nesses meses senti-me envolta num ambiente mágico, o qual ainda hoje não sei explicar.
Quando ele nasceu, o meu coração quase saltou do peito, de tanta alegria. Lembro-me de pensar que tinha de o proteger de tudo, que ele não poderia ter nada menos que a felicidade total.
Hoje agrada-me a nossa diferença de idades, pois foi graças a ela que consegui fazer parte e compreender todos aqueles meses de gravidez.
Quando quero dar a conhecer o meu irmão a alguém, existe uma história que conto sempre. Uma vez, quando andava no infantário um miúdo batia-lhe todos os dias, e quando lhe dissemos que ele tinha de se defender ele respondeu “mas eu não lhe posso bater porque ele é meu amigo”. Neste momento, percebi a pessoa que os meus pais andavam a criar e tive o maior orgulho e a maior preocupação com ele.
Actualmente é uma “peste em miniatura”, não se cala um segundo, goza com tudo, adora o Benfica (quem dele discordar neste aspecto, tem discussão assegurada), tem um número razoável de namoradas (as quais recebem dignas cartas de amor) e estudar é coisa que lhe desagrada bastante.
Por outro lado é tímido, generoso, carinhoso, protector e capta tudo o que se passa à sua volta.
Posso afirmar, com toda a certeza, de que tive uma vida antes e após o seu nascimento.
Por ele, o meu amor é único e incondicional.
Quando o vejo dormir na sua cama, sossegado, sem remorsos nem preocupações, a sua tranquilidade passa para mim e fico a desejar puder um dia ter um filho.
Na realidade nunca me tinha preocupado com isso, até recentemente tomar consciência de que os anos estão a passar a um ritmo acelerado e que não pretendem abrandar a sua velocidade.