domingo, março 18, 2007

História curta

Ele olhou para ela mas não a viu. Tal e qual como nos dias anteriores.
Ela esperava por ele. Não compreendia como ele não reparava nela se todos os dias, todos os santos dias, ela se enfeitava só para captar o seu olhar.
Ele tinha uma esperança secreta, a de que alguém se apaixonasse por ele à primeira vista, vai daí frequentava o mesmo café, onde entrava sempre de forma quase épica.
Ela amava-o. Não o conhecia mas amava-o. Amava-o desde a primeira vez em que ele tinha entrado pela porta do seu café habitual. Imaginava-o o homem da sua vida.
Ele continuava com o seu ritual. Sentava-se na mesa junto à janela e ia intervalando a leitura do jornal do dia, com um levantar de cabeça, olhando em redor. Ele acreditava que o Sol que se lhe projectava na cara, vindo da rua, lhe iluminava a expressão. No fundo, ele procurava alguém que o visse com olhos diferentes, com olhos de paixão.
Seria hoje que ela lhe iria dirigir a palavra pela primeira vez. O que lhe dizer? Ela não sabia mas já não conseguia evitar mais aquele olhar iluminado pelo Sol. E se no dia seguinte ele abandonasse aquele café? Ela jamais se perdoaria por não ter tentado falar com ele, por o tornar mais real na sua vida.
Ele esperava a mulher ideal. A que ao entrar naquele café lhe lançasse um olhar de enamoramento imediato. Ela não lhe falaria, limitar-se-ia a sentar e a fixá-lo de forma embaraçada, como se não conseguisse evitar tirar os olhos dele.
Ela foi ter com ele.
- “Olá, bom dia, tem lume?”.
- “Não, não fumo”.
“Ah, está bem, então obrigada na mesma.”- respondeu ela num tom decepcionado.
Que mulher era aquela que lhe tapava a visão da possível entrada do amor da sua vida?!
Que homem aquele que nem soube fazer conversa com ela depois daquele exemplo óbvio de necessidade de atenção?
No terminar dos seus pequenos-almoços cada um fez o seu caminho habitual para o trabalho, ele pensando que amanhã poderia ser o seu dia de sorte, ela pensando que teria de encontrar outro amor imediato na sua vida.
Seja como for, ambos mudaram de café no dia seguinte.