domingo, julho 09, 2006

E por falar em futebol,..

Não consigo deixar de pensar que o futebol reflecte o espírito de um povo, sendo que a paixão por tal desporto tende a ser inversamente proporcional ao sucesso económico e social que o próprio país terá. Por exemplo, os brasileiros vivem cada partida como se a sua vida dependesse disso, no entanto, se falarmos na Noruega ou Suécia, futebol não será a primeira palavra que nos surge na cabeça, com toda a certeza.
Confesso que não percebo grande coisa de futebol, apenas o suficiente para não bater palmas quando a equipa contrária marca golo, portanto, não esperem nenhum comentário futebolístico ao estilo “Cinha Jardim”, porque não será isso que vão encontrar nas próximas linhas.
Neste Mundial, Portugal parou para assistir aos jogos da sua selecção. À medida que se iam somando vitórias o espírito nacional exultava e fazia-se a festa.
Ganhou-se aos pretensiosos ingleses e o nosso país não parou de festejar. O desejo de atingir o primeiro lugar tornou-se quase palpável, sentia-se essa vontade no ar.
No jogo seguinte, com a França, acabámos por perder, mas o caminho para o Marquês não foi esquecido. O primeiro lugar foi tirado do pensamento e substituído por “um terceiro lugar já não é mau”.
Jogámos com a Alemanha e voltámos a perder. O quarto lugar era nosso e ainda havia quem festejasse.
Sonhou-se com o primeiro lugar, contentávamo-nos com o terceiro e acabámos conformados com o quarto lugar.
Percebo quem diz que deveríamos estar contentes com a posição alcançada, tendo em conta o número de países que iniciaram a competição, porém, não posso deixar de relacionar este pensamento com a maneira como os portugueses encaram todos os outros aspectos da sua vida.
Ao recordar algumas aulas de História, só posso concluir que o espírito do povo lusitano mudou muito ao longo dos anos.
Acredito que no nosso íntimo continuamos a desejar conquistar alguma coisa, mas sentimos uma mistura de vergonha e de constrangimento por o demonstrar.
Preferimos ganhar a simpatia dos outros do que o seu respeito, acreditamos que ser tratado por senhor doutor e engenheiro é que é importante, tendemos a desacreditar os elogios que nos são feitos, não dizemos que somos muito bons, mesmo que seja verdade, com medo de como isso irá soar a quem nos ouve, comparamo-nos sempre com os piores e jamais com os melhores.
Chateia-nos que ainda exista alguém que pense que somos uma colónia espanhola, no entanto, não temos orgulho suficiente no nosso país para o tentar exportar melhor.
Somos dos últimos países em quase tudo o que for aspecto positivo e estamos nos lugares cimeiros quando o assunto é gravidez na adolescência, acidentes de viação ou taxas de alcoolismo.
Queixamo-nos do estado do país, mas logo de seguida dizemos que poderia ser bem pior, se necessário, comparamo-nos com o sofrimento das pessoas em África, com o perigo de vida no Brasil e terminamos por concordar que afinal nem estamos mal de todo.
Somos um país que se conforma com leis punitivas aplicadas às mulheres e que, em simultâneo, permite que criminosos sejam soltos quando a sua infracção ainda está “quentinha”.
Correndo o risco de indignar quem lê este texto, ouso dizer que somos um povo com espírito de vassalos. Estendemos o tapete vermelho a estrangeiros e a doutores, o resto, é para ser tratado ao pontapé.
Neste momento não sabemos muito bem quem somos, preferimos ser definidos por outros como pessoas de interior triste, que cultivam o fado, simpáticos para os visitantes, com bonitas praias e fantástica comida. Por enquanto, talvez isto nos vá chegando, mas não seria já hora de deixar de lado a frase de que “poderia ser pior”?